Olho pela janela da avenida paulista e de repente um flagrante: uma ambulância pede passagem em meio ao trânsito habitual das 9h, 10h, 11h... qualquer hora do dia e da noite. A marcha já apressada do paulistano é intensificada pelo grito da sirene pedindo passagem:
- Emergência!
O tempo sincroniza a vida das pessoas nas agendas atribuladas, quanto mais compromissos melhor, quanto mais se preenche o espaço em branco, mais se vive. A ambulância encosta no carro da frente, elimina espaços vazios, força com que os automóveis ocupem os vãos. Espaços vazios são perdas e não há tempo para contemplação, como esse instante raro em que aperto o botão da câmera fotográfica. Não há tempo para o presente, é preciso construir o futuro e é:
- Urgente!
O tempo urge, não há tempo a se desperdiçar, tempo é dinheiro, e ambos são curtos, curto é o tempo e o tempo ninguém curte. “Curtir” no Facebook é curto, basta um clique. E é com um clique que se salta de cena em cena: do café da manhã para a reunião, da conferência para a entrevista, da mensagem no celular para a internet, do escritório para a sala de aula, da formatura para o casamento, para o nascimento dos filhos, dos netos...
- Rápido!
O ritmo veloz da cidade contrasta com o ritmo lento das batidas do coração do paciente na maca, rumo ao hospital, e dos pedestres e motoristas, rumo ao seu destino e ao encontro dele. “É uma emergência!”, insiste a sirene. O tempo passa devagar para o acidentado à espera do medicamento, enquanto voa para o motorista que acelera:
- Abram caminho! É a vida de uma pessoa que está em jogo, e com a vida não se brinca!
Que tipo de ambulância irá resgatar o ser humano da toada alucinante do cotidiano, para que possa viver o seu tempo, a seu tempo? E quem é o assassino que está matando o tempo que lhe cabe?